O presidente da Câmara de Olivença, Manuel José González Andrade, considera que as palavras do ministro da Defesa Nacional, Nuno Melo, são despropositadas e pertencem ao século XIX e não ao século XXI. "Tanto na forma como no conteúdo são afirmações inaceitáveis", cita na sua edição de hoje o jornal "El País".

"Em Olivença conhecemos a nossa história, o que nos faz ter uma identidade única na Península Ibérica", disse. Para Manuel José González Andrade o que é grave é que estas declarações partem de um ministro português, que “não é qualquer um". "Olivença é a capital ibérica, somos uma ligação entre os dois países. Queremos aproveitar este potencial que a história nos deu", sublinha o autarca.

E relembra que muitos vizinhos têm laços históricos com Portugal e até dupla nacionalidade, com direito votar em ambos os países. "Antes de Espanha e Portugal fazerem parte da União Europeia, aqui não havia fronteiras, a única coisa que nos separou e separa é o rio Guadiana", diz. E garante que se orgulha do passado português do seu concelho.

Olivença, que fica a 23 km de Elvas e a 24 km de Badajoz (236 km de Lisboa e 424 km de Madrid), tem actualmente uma população de 11.776 habitantes, dos quais cerca de 1.500 oliventinos, na sua maioria idosos, falam português. As novas gerações também têm beneficiado de medidas para manter a língua viva no concelho.

As relações entre os habitantes da zona fronteiriça entre Portugal e Espanha são tão normais como as de qualquer outro local da linha que separa os dois países. Muitos espanhóis vão trabalhar, fazer compras ou passear nas cidades portuguesas e vice-versa. Além disso está em curso um projecto de cooperação transfronteiriça Eurobec, da União Europeia, do qual fazem parte Badajoz, pelo lado espanhol, e Elvas e Campo Mayor, pelo lado português.

Morador de Olivença, o antigo presidente do governo da Estremadura, Guillermo Fernández Vara, acredita que no mundo de hoje devemos somar, não dividir: "São debates que podiam ter existido há anos, agora não fazem sentido. As pessoas de Olivença sentem-se muito espanholas, mas sem abdicar da sua história portuguesa".

Na sua opinião, hoje não há fronteiras e devemos construir uma Europa mais unida e melhor, sobretudo no contexto actual. "Nós, oliventinos, somos filhos de Espanha e netos de Portugal e levamos isso na alma, é passado, presente e futuro", afirma. Sobre as palavras de Nuno Melo, quer acreditar que resultaram de um momento particular, mas lembra que o ministro tem de ter consciência de que representa o Governo português.

Também a actual presidente do Governo Regional da Estremadura, María Guardiola, desvalorizou o assunto: "É uma discussão que nem está em cima da mesa", mas adiantou que "é claro que vamos continuar a defender a hispanidade do nosso povo". De resto, enaltece a relação "fantástica" entre os dois países. “Nos últimos 30 anos de cooperação transfronteiriça, creio que fizemos mais progressos como parceiros e irmãos europeus do que nos últimos séculos", salienta.

O ministro da Defesa Nacional, Nuno Melo, ressuscitou um tema que de temos a tempos regressa à baila, quando no dia 13 de Setembro afirmou "Olivença é portuguesa, naturalmente, e não é uma provocação". Aberta a polémica, explicou que falava em nome pessoal e enquanto líder do CDS-PP, desvinculando o governo social-democrata de quaisquer afirmações.