O presidente cessante Nicolás Maduro foi reeleito para um terceiro mandato consecutivo na Venezuela, ao obter 5,15 milhões de votos, à frente do candidato da oposição Edmundo Gonzalez Urrutia, que obteve pouco menos de 4,5 milhões.

A oposição venezuelana reivindica a vitória nas eleições presidenciais de domingo, com 70% dos votos para o candidato da oposição Edmundo Gonzalez Urrutia obteve 70% dos votos, afirmou a líder opositora María Corina Machado, recusando-se a reconhecer os resultados proclamados pelo CNE.

Vários países já felicitaram Maduro pela vitória, como Nicarágua, Cuba, China e Irão — mas outros demonstraram grande preocupação com a transparência das eleições na Venezuela além de Portugal, como Espanha e Estados Unidos.

Mas como é que estas operações podem ter sido condicionadas por Maduro?

Operações tartaruga

Tática inventada no chavismo, as operações-tartaruga podem ter sido utilizadas para provocar morosidade e filas enormes nas eleições.

Mesmo assim, tal não deverá ter afastado os eleitores das urnas. "Acho difícil que as pessoas, sabendo o quão perto estão de uma mudança política desejada, abandonem as filas porque são longas ou lentas", referiu ao G1 o diretor do Centro de Estudos Políticos e de Governo da Universidade Católica Andrés Bello, antes do ato eleitoral.

Boletins com Maduro a aparecer 13 vezes

O boletim destas eleições mostrava 38 fotografias e, dessas, 13 eram de Nicolás Maduro. No total existiam 10 candidatos às eleições na Venezuela.

A prática é recorrente — e legal, já que o número de vezes que surge representa os partidos que o apoiam —, mas nenhum candidato aparecia tantas vezes.

Com esta estratégia, Maduro era o candidato mais fácil de identificar.

Delegações bloqueadas

Na sexta-feira, uma delegação do Partido Popular Europeu, composta por dez eurodeputados, onde se incluía o eurodeputado português Sebastião Bugalho, eleito pela coligação Aliança Democrática, "aterrou em Caracas a convite da oposição venezuelana, para acompanhar o processo eleitoral".

Contudo, a delegação ficou primeiro retida no aeroporto de Caracas e foi depois obrigada a regressar a Madrid, Espanha.

Também o presidente do Panamá, José Raúl Mulino, denunciou que um avião que transportava vários ex-chefes-de-Estado para participar como observadores nas eleições de domingo foi impedido de levantar voo. Maduro afirmou que não seriam observadores oficiais.

Para muitos, o sucedido terá sido uma forma de impedir o escrutínio eleitoral.

Encerramento de fronteiras

Mais de 5.200 venezuelanos viajaram para o seu país a partir da Colômbia entre 20 e 27 de julho, na semana prevista para as eleições presidenciais.

O motivo? O Governo venezuelano anunciou que encerraria as fronteiras terrestres desde sexta-feira, originando uma interrupção inesperada do fluxo na fronteira entre os dois países vizinhos.

Na Colômbia, onde estão registados mais de 2,8 milhões de venezuelanos, apenas 7.012 estavam inscritos para votar no domingo devido às dificuldades de registo nos consulados.

Perante a impossibilidade de voto para os milhões de venezuelanos da Colômbia, a oposição emitiu um apelo em Bogotá para a participação no escrutínio a quem tenha possibilidade de viajar para o país de origem.

Propaganda e controlo dos media

A imagem do governante comunista foi omnipresente durante a campanha: apareceu na televisão, no rádio, em outdoors, murais, portagens, ambulâncias, propaganda no YouTube e inúmeros vídeos em plataformas como o TikTok.

A figura, usual na paisagem quotidiana da Venezuela, multiplicou-se por todo o lado à procura de um terceiro mandato, o que se veio a concretizar.

A presença de Maduro é uma constante na televisão estatal, cujo sinal define a agenda, com inúmeras transmissões diárias da sua “peregrinação” pela Venezuela.

O presidente, que foi motorista de autocarro na juventude, muitas vezes aparece ao volante de uma camioneta enquanto conversa com a esposa, Cilia Flores, e autoridades, como se estivesse a protagonizar um reality show. Desenhos animados de propaganda chamados “Supervisores” retratam-no como um super-herói com punho de ferro que luta contra a oposição e o arquirrival: os Estados Unidos.

Um filme sobre a sua vida estreou num teatro icónico de Caracas e um livro biográfico foi apresentado recentemente. Assistiu à estreia na primeira fila.

Além disso, a imprensa denunciou o bloqueio de sites de notícias, numa Venezuela onde mais de 400 meios de comunicação foram fechados em 25 anos de governos chavistas.

Escalada de repressão durante a campanha

A organização Amnistia Internacional (AI) denunciou a escalada de repressão durante o período da campanha eleitoral na Venezuela.

“Os meses que antecederam essas eleições foram marcados por ataques incessantes ao espaço cívico, dezenas de detenções arbitrárias, desaparecimentos forçados, tortura, represálias contra comerciantes e prestadores de serviços e medidas administrativas arbitrárias e abusivas”, declarou Ana Piquer, diretora da Amnistia Internacional para as Américas, citada num comunicado da organização não-governamental (ONG) de direitos humanos.

Para a responsável da AI, “perante o contexto de discursos intimidatórios, censura e perseguição”, a Amnistia Internacional exige “que as autoridades garantam e respeitem inquestionavelmente os direitos de todas as pessoas na Venezuela durante e após o dia 28 de julho”.

A Amnistia Internacional apelou ainda à “libertação imediata e incondicional de todas as pessoas detidas arbitrariamente por razões políticas no país, como Rocío San Miguel, Javier Tarazona e Carlos Julio Rojas”. Nessa mesma linha, a ONG sublinhou que é imperativo terminar com as detenções arbitrárias, desaparecimentos forçados e atos de tortura contra aqueles que pensam de forma diferente e contra aqueles que defendem os direitos humanos.

Ana Piquer declarou ainda que “no atual contexto de escalada da repressão, a investigação em curso do gabinete do procurador do Tribunal Penal Internacional teria competência para investigar os responsáveis por eventuais detenções, torturas, violência baseada no género e perseguições cometidas em âmbito eleitoral”.

“As autoridades responsáveis por estes crimes, dentro de toda a cadeia de comando, podem e devem ser levadas a tribunais de justiça independentes e imparciais, com todas as garantias de um processo justo”, segundo Piquer.