A audição de João Rendeiro chegou a ser adiada duas horas, mas acabou por começar apenas uma hora mais tarde no Tribunal de Verulam.

O juiz sul-africano Rajesh Parshotam começou por ler o resumo dos processos e rejeitou os argumentos da defesa de João Rendeiro, como o de que a figura jurídica da prisão preventiva não existiria na África do Sul ou de que o ex-banqueiro não teria um julgamento justo em Portugal. O juiz salientou, porém, que o pedido de extradição por parte de Portugal não foi formalizado.

Ficou assim decidido, esta sexta-feira, que João Rendeiro vai permanecer em detenção provisória - ao abrigo da convenção europeia de extradição de que Portugal e África do Sul são signatários - até ao dia 10 de janeiro e até que Portugal realize o pedido de extradição. Agora, correrá o primeiro prazo de 18 dias para devida provisão do processo na África do Sul.

Trata-se de 18 dias desde a detenção, que ocorreu a 11 de dezembro, restando agora 12 dias de validade da detenção provisória.

O magistrado rejeitou hoje libertar João Rendeiro sob a fiança de 40.000 rands (2.190 euros), como pedia a defesa, considerando que havia um elevado risco de fuga e afirmando que o ex-banqueiro “quase de certeza que fugiria", caso fosse libertado agora.

O juiz argumentou que João Rendeiro “saiu de Portugal, logo que esgotou possibilidades de recursos na justiça, para evitar prisão".

"Ele [João Rendeiro] é um fugitivo, contra as ordens dos tribunais" referiu o magistrado, justificando que "se não respeita processos judiciais em Portugal porque iria respeitar na África do sul".

"Liberta-lo não seria pelo interesse da justiça, nem aqui nem em Portugal", acrescentou.

A defesa de Rendeiro já tinha anunciado antecipadamente que iria recorrer da decisão no caso de ser negada a liberdade, mas contactada hoje pela Lusa após a leitura da decisão, a advogada June Marks não comentou o assunto.

A próxima sessão está marcada para 10 de janeiro, uma data independente dos prazos processuais, nomeadamente, o prazo de 18 dias (com eventual extensão). O prazo pode estender-se até um máximo de 40 dias se Portugal apresentar razões atendíveis.

Até agora ficaram resolvidas duas fases no processo de Rendeiro: a detenção (provisória, ao abrigo da convenção europeia de extradição) e o pedido de liberdade sob caução (negado), sendo a próxima sessão dedicada à terceira fase, que é o processo de extradição.

Até agora ficaram resolvidas duas fases no processo de Rendeiro: a detenção (provisória, ao abrigo da convenção europeia de extradição) e o pedido de liberdade sob caução (negado), sendo a próxima sessão dedicada à terceira fase, que é o processo de extradição.

O magistrado que julgou as duas primeiras fases - poderá ser outro a ser designado para o processo de extradição - sustentou a sua decisão hoje lida recordando os dois mandados de detenção, o primeiro segundo o qual Rendeiro é procurado para ser presente a tribunal em Portugal e o segundo devido a condenações.

Quinta-feira foi feriado nacional na África do Sul (Dia da Reconciliação), pelo que o processo foi hoje retomado.

O magistrado considerou não haver falta de formalidades e deu toda a informação como oriunda de fontes fiáveis acima de qualquer dúvida, contrariando a defesa, que viu todos os pilares da sua petição derrubados por Parshotam.

Contudo, o magistrado lembrou: "é correto o que diz a defesa", que se falharam os prazos e preceitos para Portugal entregar o processo de extradição na África do Sul, então "o processo de detenção provisória termina".

O magistrado considera que as autoridades portuguesas, explicaram de forma concisa os procedimento e alegações nos processos que pesam sobre João Rendeiro, em "claro contraste" com o que este alega, referiu.

O ex-banqueiro quis dar a entender que já não tem nada a tratar com os tribunais em Portugal e "embora possa parecer verdade" com registos criminais exibidos pela defesa, "falhou em dizer que foi condenado e sentenciado", destacou.

Aliás, "estaria a cumprir prisão se não viajasse para a África do Sul", realçou.

O magistrado refutou também a ideia de que Rendeiro esteja a ser perseguido, alvo de uma campanha política ou sensacionalista, como alegado pela defesa, e que por essa via não tenha um julgamento justo em Portugal.

"A lei da África do Sul prevê que não haja extradição" sem garantias de julgamento apropriado ou caso o sujeito seja discriminado no país de destino, por razões diversas, incluindo razões políticas.

Podia até demonstrar que o caso contra ele próprio era frágil e que poucas hipóteses haveria de ser extraditado e assim, justificar uma liberdade sob caução, disse o magistrado negando essa linha de raciocínio.

Por um lado, em Portugal, "teve todas as oportunidades" de se defender e recorreu até ao supremo e tribunal constitucional, disse.

Assim, "dificilmente se pode argumentar que não terá um julgamento justo ou que há inconstitucionalidades" no processo, acrescentou.

Parshotam disse ainda que o ex-banqueiro falhou em revelar quais são afinal os seus recursos , sabendo-se que tem conta bancária nos EUA e também na África do Sul.

Há igualmente dúvida sobre quantos passaportes tem: a procuradoria fala em três, e João Rendeiro diz que dois estão caducados, resumiu o magistrado, para chegar a outro ponto em que assenta a sua decisão, o perigo de fuga.

O magistrado deu como certo que o ex-banqueiro não representa um perigo para a sociedade, mas já demonstrou que poderá fugir à primeira oportunidade.

"Obter documentos de viagem e passaportes falsos não é difícil neste país. As nossas fronteiras são tão porosas" que todos os dias "muitas pessoas passam sem documentação", disse, antes de classificar João Rendeiro como "um fugitivo".

A leitura levou 50 minutos e Parshotam citou várias sentenças em casos de pedido de liberdade sob caução, inclusive uma segundo a qual o Estado deve providenciar condições à altura para a detenção e esse não pode ser argumento para a saída - como também referiu a defesa, evocando a idade de Rendeiro e de que precisa de medicamentos.

João Rendeiro estava fugido à justiça há três meses e as autoridades portuguesas reclamam agora a sua extradição para cumprir pena em Portugal.

Terceiro mandado de detenção internacional emitido contra João Rendeiro

Um terceiro mandado de detenção internacional contra João Rendeiro foi emitido pelo juiz Francisco Henriques, do Tribunal Criminal de Lisboa, que condenou o ex-banqueiro a três anos e seis meses de prisão por burla qualificada, confirmou hoje fonte judicial.

A mesma fonte disse à Lusa que o despacho do juiz a solicitar o mandado de detenção internacional já foi enviado para a Procuradoria-Geral da República (PGR) no sentido de ser associado ao pedido de extradição de João Rendeiro que será enviado para as autoridades judiciárias sul-africanas.

No despacho, segundo a mesma fonte, é pedido que o antigo presidente do Banco Privado Português (BPP) seja detido e extraditado para ser presente ao juiz do Tribunal Criminal de Lisboa para lhe ser aplicada a medida de coação de prisão preventiva no âmbito desse processo, cujo acórdão foi conhecido no passado dia 28 de setembro.

Este novo mandado de detenção internacional, acrescentou a fonte, visa reforçar o pedido de extradição e cumprir o princípio da especialidade, por forma a que, caso se concretize a extradição, João Rendeiro possa também responder por esta condenação.

A violação do princípio de especialidade por parte do Estado que requereu a extradição colocaria em causa a possibilidade de o extraditado poder ser punido por crime que não constasse expressamente no pedido de extradição enviado para as autoridades da África do Sul.

Este processo ainda não transitou em julgado, ao contrário da condenação de que o ex-presidente do BPP foi alvo em 2018 noutro processo por falsidade informática e falsificação de documento. Inicialmente condenado a cinco anos de prisão (com pena suspensa mediante o pagamento a uma instituição particular de solidariedade social), João Rendeiro viu o Tribunal da Relação de Lisboa subir em 2020 a pena para prisão efetiva de cinco anos e oito meses.

Sobre o processo mais recente e que originou este terceiro mandado de detenção (no qual foram também condenados os ex-administradores Paulo Guichard e Salvador Fezas Vital a três anos de prisão e a dois anos e seis meses de prisão, respetivamente), a mesma fonte adiantou que os três arguidos recorreram para a Relação. Neste momento decorre o prazo para o Ministério Público (MP) responder a esse recurso, não tendo ainda subido à Relação.

A agência Lusa tentou obter esclarecimentos junto da PGR sobre os desenvolvimentos deste terceiro mandado de detenção internacional, mas até ao momento não obteve resposta. A notícia sobre este terceiro mandado de detenção foi avançada na quinta-feira à noite pela SIC.

[Notícia atualizada às 13:23 com agência Lusa]