Ammar Ameen foi condenado por um crime de adesão a organização terrorista, um crime de guerra contra as pessoas e um crime de ameaça, enquanto Yaser Ameen foi condenado por um crime de adesão a organização terrorista por acórdão do coletivo de juízes presidido por Alexandra Veiga, do Tribunal Criminal de Lisboa.

Em causa esteve a ligação dos arguidos ao Daesh (grupo extremista do Estado Islâmico) e os atos praticados por estes dois muçulmanos sunitas quando ambos viveram, juntamente com a sua família numerosa, em Mossul, uma das muitas cidades do Iraque que chegou a estar ocupada por aquele movimento radical islâmico.

Nas alegações finais do julgamento, o Ministério Público (MP) tinha pedido a condenação dos arguidos a uma pena única, em cúmulo jurídico, situada perto da pena máxima de 25 anos de prisão.

O MP fez pedido tendo em conta que Ammar estava acusado por um crime de adesão a organização terrorista, nove crimes de guerra contra as pessoas e um crime de resistência e coação (a funcionário) e que Yaser respondia em julgamento por um crime de adesão a organização terrorista e oito crimes de guerra contra as pessoas.

No acórdão de hoje, o tribunal não validou a quase totalidade dos crimes de guerra que constavam da acusação e alterou o crime de resistência e coação a funcionário do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras atribuído a Ammar para crime de ameaça, punido com a pena parcelar de 16 meses de prisão.

Os dois irmãos foram ainda condenados à pena acessória de expulsão de Portugal. Cabe agora aos advogados contestar a sua execução uma vez que Portugal não extradita arguidos para países em que se aplica a pena de morte, como é o caso do Iraque.

Na leitura do acórdão, que demorou mais de duas horas, o coletivo de juízes deu como provado que os arguidos "juraram fidelidade" ao Daesh em 2014, movimento radical e violento responsável por atrocidades cometidas em Mossul, como chicoteamento de pessoas, tortura, mutilações, escravatura sexual, entre outros "crimes em grande escala" e de "crueldade chocante".

O acórdão, que foi sustentado em prova documental e testemunhal (incluindo para memória futura), refere que as informações criminais fornecidas para a investigação por entidades ligadas às Nações Unidas (ONU) foram "fundamentais para obter elementos probatórios contra os arguidos".

Em contraponto, alguns dos depoimentos de testemunhas suscitaram dúvidas ao tribunal, tendo nessas situações sido decidido a favor dos arguidos, que viram cair vários dos crimes de guerra contra as pessoas que constavam da acusação e pronúncia.

O tribunal decidiu punir Ammar com a pena mais pesada (16 anos), tendo a juíza comentado que este arguido exibiu uma "conduta agressiva ou latente", quer durante a sua permanência em liberdade em Portugal, quer em julgamento, não se inserindo na comunidade.

O coletivo de juízes criticou ainda a "postura" de Ammar em julgamento, por este insistir que "tudo isto é uma cabala" contra ele, sem evidenciar qualquer arrependimento.

Os arguidos alegam estar inocentes das acusações e os seus advogados de defesa, Lopes Guerreiro e Vítor Parente Ribeiro manifestaram já a intenção de recorrer deste acórdão para a Relação de Lisboa.

Lopes Guerreiro disse aos jornalistas que Ammar "não acreditou desde o início neste julgamento em Portugal" e que já tinha interiorizado que ia ser condenado a uma pena pesada.

Vítor Parente Ribeiro congratulou-se que todos os crimes de guerra contra as pessoas imputados a Yaser tenham caído e alegou que "não há prova" para o condenar pelo crime de adesão a organização terrorista, pelo que vai recorrer.

Este advogado criticou a situação de detenção dos arguidos que classificou ser "pior do que a Coreia do Norte", lamentando que ambos tenham sido impedidos de comunicar com a família no Iraque, não lhes tendo sido possível arrolar testemunhas no Iraque em sua defesa.

"Isto é lamentável e prejudica a defesa", declarou Vítor Parente Ribeiro, considerando ainda que a situação descrita viola o Estado de Direito e as garantias de defesa dos arguidos.

Tendo chegado a Portugal em março de 2017, vindos da Grécia, ao abrigo do programa de recolocação refugiados da União Europeia (UE), Ammar e Yaser estão em prisão preventiva desde setembro de 2021, quando foram detidos pela Polícia Judiciária

No inquérito conduzido pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal foi investigada a atividade dos arguidos enquanto membros do autoproclamado Estado Islâmico (EI), nos departamentos Al Hisbah (Polícia Religiosa) e Al Amniyah (Serviços de Inteligência) durante a ocupação do Iraque por essa organização terrorista, designadamente entre 2014 e 2016.

(Notícia atualizada às 19h27)