O Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) impediu quatro irmãos, de cinco, seis, sete e oito anos, de serem encaminhados para adoção, considerando que o regresso das crianças a casa da mãe seria "a única decisão adequada".

De acordo com o Jornal de Notícias, os menores já tinham sido institucionalizados duas vezes. Na primeira vez, as crianças foram retiradas por estarem expostas à violência doméstica do pai sobre a mãe. Já numa segunda vez, os irmãos foram encontrados sozinhos, enquanto a mãe trabalhava.

Numa das vezes em que estavam sem supervisão, o pai tinha ido comprar tabaco e deixou as crianças sozinhas no McDonald's. Noutra vez, os menores estavam à porta de casa da avó na Ajuda, em Lisboa. Já numa terceira vez, a mãe autorizou os filhos mais velhos a irem à feira, perto de casa, sem um adulto.

Sob proposta do Ministério Público (MP), o tribunal de primeira instância decidiu que os menores deveriam ser acolhidos, definitivamente, numa instituição para serem adotados, mas os pais recorreram da decisão.

No recurso, a mãe disse que pediu várias vezes ao tribunal para ouvir as crianças, mas que os pedidos foram “rejeitados sucessivamente”. A mulher, que nunca deixou de visitar os filhos enquanto estiveram institucionalizados, afirmou ainda que a casa onde viviam era “pobre, mas, ao nível da alimentação, sempre foi uma casa farta”.

Por sua vez, a mulher acusou o tribunal de ignorar os seus “esforços para se mudar para uma habitação mais condigna, tendo, inclusive, conseguido obter uma habitação camarária de tipologia T4” - que acabaria por lhe ser retirada por já não ter os menores a seu cargo.

O tribunal foi também criticado por não ter considerado “alternativas no seio da família biológica”.

O pai das crianças - que já tinha sido condenado por violência doméstica e preso por ter desrespeitado a proibição de se aproximar da vítima - também recorreu, afirmando que, enquanto estivesse na prisão, os menores podiam ficar com o seu irmão.

Apesar da má relação com a ex-companheira, o homem garantiu que os filhos eram "apegados à mãe”, pedindo que lhe fosse dada “mais uma oportunidade”, avança o JN.

Decisão primária

Os juízes desembargadores Higina Castelo, Vaz Gomes e José Correia consideraram que a decisão, “além de não ter sustento na lei, seria da maior crueldade para todos”, já que levaria “quase necessariamente à permanente institucionalização das quatro crianças ou, provavelmente pior, à separação dos quatro irmãos”.

Segundo o acórdão, citado pela publicação, a mãe “nunca as abandonou” e “sempre se bateu pelo regresso” das crianças ao lar e, “apesar de todas as adversidades, sempre trabalhou e foi melhorando as suas condições materiais de vida e a sua preparação técnica em várias áreas”, defendeu o TRL, salientando a “forte relação” da mulher com os filhos, a que estes “correspondem”.

Por outro lado, o TRL criticou os relatórios dos técnicos da Segurança Social, em que o tribunal de primeira instância se baseou para tomar a decisão. "Depreciam os mais comezinhos atos e dizeres da progenitora”, afirmou, como dar guloseimas às crianças ou ter-lhes oferecido gelados quando iam a caminho de uma aula de ginástica.

“A relação entre irmãos é das mais importantes na vida. Não será preciso percorrer bibliotecas de psicologia para disto saber (...) e, por outro lado, perceber o efeito psicologicamente devastador que a separação iria produzir em todos e cada um deles”, concluiu o TRL.