O pai de uma aluna e um militante islâmico radical emitiram uma "fatwa", ou decreto religioso, contra o professor francês Samuel Paty, decapitado na sexta-feira na região de Paris depois de exibir durante uma aula algumas ilustrações de Maomé, afirmou o ministro do Interior, Gérald Darmanin.

"Lançaram claramente uma fatwa contra o professor", disse o ministro à rádio Europe 1.

A fatwa é um pronunciamento legal emitido por um especialista em islamismo, normalmente um mufti.

O pai da aluna e o militante islâmico Abdelhakim Sefrioui estão entre as 11 pessoas detidas pelo crime, executado por um checheno de 18 anos.

Já nesta segunda-feira a polícia efetuou várias operações de busca em círculos islâmicos, anunciou também o ministro do Interior. Desde o assassinato na sexta-feira do professor Samuel Paty, várias pessoas foram detidas e quase 80 investigações foram iniciadas por um suposto crime de ódio nas redes sociais, informou Darmanin.

"Je suis prof"

Dezenas de milhares de pessoas compareceram no domingo a homenagens ao professor decapitado na França, um atentado que comoveu o país, cenário de vários atentados jihadistas desde 2015 que provocaram mais de 250 mortes.

Em Paris, os manifestantes reuniram-se na emblemática Praça da República, epicentro da grande marcha - em 11 de janeiro de 2015 -, após os ataques extremistas contra o semanário satírico Charlie Hebdo e um supermercado de produtos kosher.

Os manifestantes homenagearam Samuel Paty, com faixas onde se liam frases como "Je suis prof" ("Eu sou um professor"), "Não ao totalitarismo de pensamento" e "Liberdade de expressão, liberdade para ensinar".

Vários líderes dos principais partidos políticos estiveram presentes na homenagem em Paris: o primeiro-ministro Jean Castex; a autarca da capital, Anne Hidalgo; a presidente da região parisiense, Valérie Pécresse; e Jean-Luc Mélenchon, líder da France Insoumise. O ex-chefe de Estado, François Hollande, também participou na manifestação.

"Não temos medo. Não temos medo. Eles não vão nos dividir. Nós somos a França!", escreveu Castex no Twitter com imagens do evento.

Plano de ação contra propaganda

O presidente francês Emmanuel Macron ordenou neste domingo que "ações concretas" sejam tomadas rapidamente contra a propaganda islâmica radical espalhada pela internet.

"Ajamos rapidamente e não dêmos trégua aos que se organizam para se opor à ordem republicana", disse o presidente numa reunião realizada com seis ministros e o procurador antiterrorista, Jean-François Ricard.

O chefe de Estado planeia fortalecer a segurança das escolas e arredores até 2 de novembro, quando os alunos regressarão às salas de aula após as férias.

Além disso, um plano será ativado esta semana "contra as estruturas, associações ou pessoas próximas a círculos radicalizados" que propagam apelos ao ódio, especificou a presidência.

Macron também decidiu agir imediatamente contra aqueles que expressaram aprovação ao ataque nas redes sociais.

Desde sexta-feira, as forças de segurança "identificaram 80 mensagens que apoiam a ação do agressor. Amanhã [segunda-feira] darão lugar a procedimentos concluídos pela polícia", informou o Eliseu.

Homenagem nacional a Samuel Paty

Na tarde de sexta-feira, Samuel Paty, um professor e pai de família de 47 anos, foi decapitado próximo da escola onde ensinava história e geografia, num bairro tranquilo de Conflans Sainte-Honorine, a 30 quilómetros de Paris. O agressor, um homem de 18 anos, foi morto pela polícia.

O assassinato chocou profundamente o país, três semanas depois de um ataque islâmico, no qual um paquistanês feriu duas pessoas com uma faca à frente das antigas instalações do jornal Charlie Hebdo, e no meio de um debate sobre separatismo religioso.

No sábado, em Conflans Sainte-Honorine, cerca de mil pais, políticos locais eleitos e cidadãos anónimos reuniram-se em frente à escola onde trabalhava este professor que era próximo dos alunos, segundo relatos.

Os alunos também pareciam muito afetados pela perda, como Marie, que foi ao antigo colégio para colocar algumas flores em "homenagem ao seu antigo professor". "Lembro-me da aula dele sobre liberdade de expressão. Conversávamos sobre Charlie, fizemos alguns desenhos que ainda estão pendurados", recordou a jovem.

De acordo com o Palácio do Eliseu, na quarta-feira, será realizada uma homenagem nacional junto à família do professor assassinado, sem especificar o local.

Segundo o procurador antiterrorista Jean-François Ricard, o professor de história organizou um debate com seus alunos para a matéria de educação cívica, durante o qual exibiu as ilustrações do profeta Maomé. Antes, o professor teria convidado os alunos que não quisessem participar a retirarem-se da sala de aula.

No total, 11 pessoas foram detidas desde sexta-feira, principalmente os pais, avô e irmão mais novo do agressor, entre outros.

Um conselho de defesa, presidido por Macron, reuniu-se no final da tarde deste domingo para discutir a ameaça extremista.