Quase seis anos após a tragédia, as marcas persistem na Estrada Municipal 255 (EM255), perto de Borba, no distrito de Évora, com o corte do trânsito junto ao troço que ruiu. E também na memória da população, ainda que o tema seja cada vez menos falado.

“Acho que há muitas pessoas que já se esqueceram, eu ouço muito pouco falar disso”, confessa à agência Lusa Margarida Figueiras, enquanto convive com amigos na esplanada de um café situado no centro da cidade alentejana.

Também Mavíldia Martins, que passeia com uma amiga, diz à Lusa que o acidente “já está mais esquecido” e arredado das conversas habituais, mas avisa que as pessoas “deviam lembrar-se, porque foi um problema muito grande”.

“É melhor que se fale”, pois “são coisas que não deviam acontecer, para mais já estava um bocadinho previsto que isso iria acontecer”, assinala.

Pelas ruas da cidade, algumas pessoas questionadas pela Lusa evitam apontar culpados pelo acidente ou nem sequer querem falar sobre o assunto, alegando que a terra é pequena e que todos se conhecem.

Não é o caso de Joaquim Caeiro, que aceita interromper a conversa com um amigo, para defender o presidente da Câmara de Borba, António Anselmo, um dos seis arguidos que se vão sentar no ‘banco dos réus’. Na sua opinião, o autarca “não tem a mínima culpa”.

“Se ele fosse fechar a estrada” antes de o acidente ter acontecido, “comiam-no [criticavam-no] e ele não fez isso”, argumenta, sugerindo que a população não iria aceitar o corte preventivo da circulação rodoviária na EM255.

Considerando que “há vários responsáveis” pela tragédia, Joaquim Caeiro aponta “os engenheiros, a pedreira que estava a laborar e toda essa gente” como culpados pelo que aconteceu.

“Ela não caiu sozinha. Andavam lá a laborar, por baixo da estrada, e mais coisas assim que não convém a gente falar. Eles é que sabem, os técnicos”, atira.

Margarida Figueiras também relata que tem ouvido dizer que a pedreira que estava a laborar “já tinha um buraco muito fundo”, frisando que “as pessoas que lá trabalhavam deviam ter noção de que aquilo já estava muito escavado”.

A cruzar em passo apressado o centro de Borba, Agostinho Cardoso abranda para contar que, ultimamente, o assunto do acidente surge mais por causa da exigência feita pelas pessoas para que a EM255, que liga a Vila Viçosa, seja reabilitada.

Através daquele caminho, era “muito mais perto para Vila Viçosa, daqui para lá e de lá para cá, do que pela variante”, pelo que a reabilitação da via “faz muita falta”, reforça.

Uma opinião partilhada por todas pessoas ouvidas pela Lusa e um amigo de Margarida Figueiras ilustra que, devido à derrocada e ao consequente corte da estrada, a distância entre Borba e Vila Viçosa passou de quatro para 11 quilómetros.

“Se fosse no Norte, a estrada já estava reposta. Aqui somos alentejanos, está quieto”, critica também Joaquim Caeiro.

Quanto ao julgamento do caso, que começa na quinta-feira, no Tribunal Judicial de Évora, ninguém arrisca antever o desfecho.

A tragédia foi igualmente marcante para os bombeiros da corporação de Borba envolvidos nas operações de socorro e um dos primeiros elementos a chegar ao local ainda guarda na memória tudo o que viu.

“Um episódio destes vai demorar algum tempo a esquecer”, afirma à Lusa o bombeiro Pedro Lapão, admitindo que o acidente ainda é assunto de muitas conversas no quartel da corporação.

O comandante dos Bombeiros de Borba, Joaquim Branco, concorda com o seu subordinado e lembra a dimensão, duração e complexidade da operação de resgate dos corpos das cinco vítimas mortais.

“Foram 13 dias de operações, 24 sobre 24 horas, e foi sem dúvida das maiores operações de Proteção Civil no país, não pela sua dimensão em termos de área, mas pela sua complexidade e também pelo número de entidades envolvidas”, afiança.

Na tarde de 19 de novembro de 2018, um troço de cerca de 100 metros da EM255, entre Borba e Vila Viçosa, ruiu devido ao deslizamento de um grande volume de rochas, blocos de mármore e terra para o interior de duas pedreiras.

O acidente causou a morte de dois operários de uma empresa de extração de mármore na pedreira que estava ativa e de outros três homens, ocupantes de duas viaturas que seguiam no troço de estrada que colapsou e que caíram para o plano de água da pedreira sem atividade.