“Respeito” foi das palavras mais presentes na manifestação de centenas de professores frente à Assembleia da República esta tarde, dia em que o ministro da Educação, João Costa, esteve a ser ouvido no parlamento sobre a proposta do Orçamento do Estado para 2023 (OE2023).

O “respeito” exigido nos cartazes empunhados pelos professores ali presentes foi também reivindicado no discurso dos seus representantes sindicais, que dizem que a greve de hoje, com uma adesão que “já há muitos anos não acontecia”, foi “uma lição” ao Governo e a um ministro “que não esteve disponível” para discutir um protocolo negocial que estabelecesse um calendário para ao longo da legislatura dar resposta às reivindicações dos professores.

“Estamos a falar de um Governo que tem no seu programa a discussão e a celebração de um pacto para a Educação para pacificar o setor, mas depois um simples protocolo negocial não quer fazer. Portanto, a hipocrisia deve acabar”, disse Mário Nogueira, secretário-geral da Federação Nacional dos Professores (Fenprof), uma das estruturas sindicais que convocou o dia de luta de hoje.

Segundo dados sindicais, a greve teve uma adesão global a rondar os 80%, mas mais de 90% dos educadores de infância e professores do 1.º ciclo paralisaram hoje, e das 853 escolas públicas 378 ficaram hoje fechadas e sem aulas.

Em causa estão problemas antigos, como a precariedade, o congelamento do tempo de serviço, o congelamento das progressões, a aposentação e os horários, mas também problemas mais recentes como o crescimento dos professores não profissionalizados nas escolas – mais 30% só este ano.

Segundo Mário Nogueira, esta situação tem impacto na educação e na atratividade de novos professores, mas também na mobilidade por doença, com o secretário-geral da Fenprof a deixar críticas às “insinuações” de baixas fraudulentas dos docentes e a possibilidade de contratação pelas escolas.

“Ainda é tempo de podermos sentar à mesa e ver como se pode corrigir alguns aspetos do OE, não é para resolver os problemas dos professores no próximo ano, é para dar um sinal e começar a dar respostas a estes problemas. Se isso não acontecer, aí a luta continua. Com os dados que hoje temos de adesão à greve o que posso garantir e já conversámos entre as organizações sindicais é que hoje não foi o dia da luta, foi o primeiro dia da luta”, disse Mário Nogueira, acrescentando que as estruturas sindicais já discutem “outras ações muito próximas”.

Mário Nogueira acusou ainda o Governo, sobre a possibilidade de a contratação de professores poder passar diretamente para as escolas, de querer enfraquecer a classe.

“Nós sabemos as pressões que alguns diretores mesmo já hoje fizeram sobre os professores, portanto percebemos porque é que o ministro quer fazer essa transferência no recrutamento e posso dizer que no próximo dia 08, na primeira reunião de revisão dos concursos entregaremos um abaixo-assinado que já conta com milhares e milhares de assinaturas de professores contra esse procedimento”, disse.

Mário Nogueira disse esperar que o ME use a negociação “para dialogar, para resolver problemas e não simule a negociação para fazer o que bem lhe apetece” e que com dia de hoje os professores estão a dizer ao Governo que exigem ser respeitados e valorizados.

Foi precisamente o sentimento de desvalorização profissional que levou Sandra Esteves, professora de Biologia e Geologia, a marcar presença na manifestação.

“Quando comecei o ensino tinha para mim que era uma profissão que valeria a pena, que era uma profissão que nos valorizava e que sentia éramos reconhecidos e isso tem-se vindo a degradar”, disse à Lusa.

Seguiu a carreira incentivada pela mãe, também professora da mesma disciplina, mas disse que nos últimos anos os professores têm sido desvalorizados.

“Nota-se isto porque temos sido atacados em muitas frentes e a verdade é que quando foi na pandemia fomos tidos em conta, perceberam que o nosso trabalho era fundamental, conseguiram reconhecer isso, mas rapidamente se esquecem e não nos dão a devida atenção em muitos aspetos”, afirmou a professora.

Para Joana Rocha, professora de português há 23 anos, que só este ano conseguiu ficar na mesma escola do que no ano anterior e que está há mais de duas décadas a receber o mesmo vencimento, dignidade foi o que os professores perderam ao longo do tempo.

“Gostava que houvesse mais dignidade na forma como os professores são tratados, nós não somos uns preguiçosos, como muitas vezes a sociedade nos vê, somos lutadores. Muitas vezes conseguimos fazer o que as famílias não conseguem, resgatamos alunos, preocupamo-nos com eles e conseguimos dar o nosso contributo para a sociedade e fazer com que os alunos sejam um dia cidadãos valiosos para o nosso país”, disse.

Paula Santos, líder parlamentar do PCP, acompanhada do deputado Alfredo Maia, e Catarina Martins, líder do Bloco de Esquerda, acompanhada da deputada Joana Mortágua, marcaram presença no protesto frente à escadaria da Assembleia da República.