O evento, que tinha como mote “A inclusão vai além da visão”, foi organizado pelo projeto Sexto Sentido, em conjunto com a EDUPA (Educação Plena) e a Câmara do Porto, no dia da Inclusão e no âmbito da Semana Europeia do Desporto, explicou à Lusa a mentora do projeto Bárbara Pereira.

O desafio, após formadas as duplas, era que cada um caminhasse 2,5 quilómetros com os olhos vendados. A meio, o guia passaria a ser o vendado, permitindo ao longo dos cinco quilómetros aos guias e aos vendados perceber que os cegos podem fazer desporto de forma segura.

“Estamos a proporcionar a primeira caminhada inclusiva, de cinco quilómetros, pelo Parque da Cidade, dando às pessoas a oportunidade de caminhar, ou de correr, se for esse o caso, de uma forma segura”, explicou Bárbara.

E prosseguiu: “é claro que estas pessoas não vão sentir o que uma pessoa cega sente. Nós, os cegos, estamos 24 sobre 24 horas às escuras, mas, neste caso, as pessoas vão ter essa sensibilidade, perceber e ter empatia quando se caminha ou corre vendado”.

Para a mentora, a mensagem do evento é que “a inclusão vai além da visão e que o desporto é para todos”, bastando, para tal, as necessárias “adaptações”.

Meio percurso depois, a Lusa falou com duas das duplas que, no final da tarde de quinta-feira, protegidos pelo isolamento do Parque da Cidade, receberam os “ensinamentos” do que é viver todos os dias sem a visão.

Já no papel de guia, Henrique Adão, de 22 anos, revelou que muitos dos participantes “fazem parte da U.Dream, uma associação de voluntariado e desenvolvimento de líderes sociais para estudantes universitários”, tendo respondido ao convite para “testar, de venda posta, como são estas dificuldades”.

“De início é complicado, pois parece que vai sempre aparecer alguma coisa à frente e termos de nos guiar pelos olhos de outra pessoa é sempre difícil (…), mas vamos desenvolvendo confiança na pessoa que nos está a guiar e habituamo-nos. A meio já caminhava quase normalmente”, respondeu, triunfante.

O estudante universitário adicionou outra palavra ao diálogo quando falou em “empatia”: “o facto de ter vontade de estar na posição de outra pessoa com mais dificuldades do que nós, só acontece se houver empatia. É preciso confiança e também um bocadinho de coragem para correr ou caminhar os 2,5 quilómetros de olhos vendados”, disse.

Ao seu lado, vendada, Sílvia Rodrigues, 21 anos, também estudante universitária, admitiu que de início a sensação “é estranha”, mas depois surge a “confiança no guia e flui naturalmente”.

“Mais projetos e mais eventos como este são muito importantes para que quem não lida diariamente com a falta de visão possa sentir um pouco do que quem não tem visão sente”, acrescentou antes de retomar a marcha.

José Moreira, 37 anos, foi o guia de Teresa Ferreira, de 62 anos, louvando ambos a iniciativa em que decidiram participar por motivos diferentes, mas a mesma motivação: aprender.

“Esta iniciativa é de louvar e quero dar os parabéns ao projeto, pois é muito interessante vir fazer de guia para pessoas que precisam de experienciar. É importante para quem vê sentir o que um invisual sente” começou por dizer o homem, que fizera a primeira parte do percurso vendado.

Questionado sobre as sensações vividas respondeu: “no percurso de 2,5 quilómteros comecei a ouvir muito melhor as coisas, a prestar atenção às pessoas a correr à volta, o próprio sol a bater na cara. Foi como se aparecesse um sexto sentido em mim”.

Teresa Ferreira caminhou pela primeira vez vendada e foi pela primeira vez guia, mas já conhece o projeto e a mentora, explicando que caminhar vendada trouxe-lhe “sensações boas: a audição aumentou". "Consigo ouvir muito melhor à minha volta”, contou.

“Já tive esta experiência noutro ambiente, pois já conheço a Bárbara há muitos anos e ela já organizou um jantar às cegas”, revelou antes de elogiar o projeto.

*Por Jorge Fonseca (texto) e Estela Silva (fotos), da agência Lusa